Não sei o que está acontecendo comigo, diz a
paciente para o psiquiatra.
Ela sabe.
Não sei se gosto mesmo da minha namorada, diz um
amigo para outro.
Ele sabe.
Não sei se quero continuar com a vida que tenho,
pensamos em silêncio.
Sabemos, sim.
Sabemos tudo o que sentimos porque algo dentro de
nós grita. Tentamos abafar esse grito com conversas tolas, elucubrações,
esoterismo, leituras dinâmicas, namoros virtuais, mas não importa o método que
iremos utilizar para procurar uma verdade que se encaixe em nossos planos: será
infrutífero. A verdade já está dentro, a verdade se impõe, fala mais alto que
nós, ela grita.
Sabemos se amamos ou não alguém, mesmo que esteja
escrito que é um amor que não serve, que nos rejeita, um amor que não vai
resultar em nada. Costumamos desviar esse amor para outro amor, um amor
aceitável, fácil, sereno. Podemos dar todas as provas ao mundo de que não
amamos uma pessoa e amamos outra, mas sabemos, lá dentro, quem é que está no
controle.
A verdade grita. Provoca febre, salta aos olhos,
desenvolve úlceras. Nosso corpo é a casa da verdade, lá de dentro vêm todas as
informações que passarão por uma triagem particular: algumas verdades a gente
deixa sair, outras a gente aprisiona e finge esquecer. Mas há uma verdade única
: ninguém tem dúvida sobre si mesmo.
Podemos passar anos nos dedicando a um emprego
sabendo que ele não nos trará recompensa emocional. Podemos conviver com uma
pessoa mesmo sabendo que ela não merece confiança. Fazemos essas escolhas por
serem as mais sensatas ou práticas, mas nem sempre elas estão de acordo com os
gritos de dentro, aquelas vozes que dizem: vá por este caminho, se preferir,
mas você nasceu para o caminho oposto. Até mesmo a felicidade, tão propagada,
pode ser uma opção contrária ao que intimamente desejamos. Você cumpre o ritual
todinho, faz tudo como o esperado, e é feliz, puxa, como é feliz.
E o grito lá dentro: mas você não queria ser feliz,
queria viver!
Eu não sei se teria coragem de jogar tudo para o
alto.
Sabe.
Eu não sei por que sou assim.
Sabe.
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