A felicidade é desprezada por muita gente. A pessoa
feliz sofre o preconceito de parecer uma pessoa vazia, sem conteúdo. No
entanto, algo ela tem, senão não incomodaria tanto. Será que é porque ela nos
confronta com nossa própria miséria existencial? É irritante ver alguém
naturalmente linda, rica, simpática, inteligente, culta, talentosa, apaixonada
e, ainda por cima, magra! Essa ninfa nunca ouviu falar em insônia, depressão,
dívidas, mousse de chocolate?
Os felizes ainda estão associados ao padrão
"comercial de margarina", portanto, costumam ser idealizados - e
desacreditados. É como se fossem marcianos, só que não são verdes. Por isso,
damos mais crédito aos angustiados, aos irônicos, aos pessimistas. Por não
aparentarem possuir vínculo com essa tal felicidade, dão a entender que têm uma
vida muito mais profunda. Você é feliz? Não espalhe, já que tanta gente se
sente agredida com isso. Mas também não se culpe, porque felicidade é coisa bem
diferente do que ser linda, rica, simpática e aquela coisa toda. Felicidade, se
eu não estiver muito enganada, é ter noção da precariedade da vida, é estar
consciente de que nada é fácil, é tirar algum proveito do sofrimento, é não se
exigir de forma desumana e, apesar (ou por causa) disso tudo, conseguir ter um
prazer quase indecente em estar vivo.
O psicanalista Contardo Calligaris certa vez disse
uma frase que sublinhei: "Ser feliz não é tão importante, mais vale ter
uma vida interessante". Creio que ele estava rejeitando justamente esta
busca pelo kit felicidade, composto de meia dúzia de realizações convencionais.
Ter uma vida interessante é outra coisa: é cair e levantar, se movimentar,
relacionar-se com as pessoas, não ter medo de mudanças, encarar o erro como um
caminho para encontrar novas soluções, ter a cara-de-pau de se testar em outros
papéis - e humildade para abandoná-los se não der certo. Uma vida interessante
é outro tipo de vida feliz: a que passou ao largo dos contos-de-fada. É o que
faz você ter uma biografia com mais de 10 páginas.
Se você acredita que ser feliz compromete seu
currículo de intelectual engajado, troque por outro termo, mas não cuspa neste
prato. Embriague-se de satisfação íntima e justifique-se dizendo que é um
louco, apenas isso. Como você sabe, os loucos sempre encontram as portas do céu
abertas.
Rita Lee, que já passou por poucas e boas, mas
nunca se queixou de não ter uma vida interessante, anos atrás musicou com
Arnaldo Batista estes versos: "Se eles são bonitos, sou Alain Delon/ se
eles são famosos/ sou Napoleão/se eles têm três carros/ eu posso voar".
Também faço da Balada do Louco meu hino, que assim encerra: "Mais louco é
quem me diz que não é feliz".
Eu sou feliz.
2 comentários:
Lindo Maria José...
Já que não se pode falar,
não sou linda, nem rica...
não sou interessante...
vou dizer que sou louca!!!
(agora muito feliz)
Feliz e próspero 2015, abraços carinhosos
Maria Teresa
Maria José Lindissimo, e ser feliz não e nunca será pecado. Bom ano de 2015 para ti e família.
Beijos
Santa Cruz
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