Benditos os que conseguem se deixar em paz. Os que
não se cobram por não terem cumprido suas resoluções, que não se culpam por
terem falhado, não se torturam por terem sido contraditórios, não se punem por
não terem sido perfeitos. Apenas fazem o melhor que podem.
(...) Particularmente, gosto de quem tem
compromisso com a alegria, que procura relativizar as chatices diárias e se
concentrar no que importa pra valer, e assim alivia o seu cotidiano e não
atormenta o dos outros. Mas não estando alegre, é possível ser feliz também.
Não estando “realizado”, também. Estando triste, felicíssimo igual. Porque
felicidade é calma. Consciência. É ter talento para aturar o inevitável, é
tirar algum proveito do imprevisto, é ficar debochadamente assombrado consigo
próprio: como é que eu me meti nessa, como é que foi acontecer comigo? Pois é,
são os efeitos colaterais de se estar vivo.
Se é para ser mestre em alguma coisa, então que
sejamos mestres em nos libertar da patrulha do pensamento. De querer se adequar
à sociedade e ao mesmo tempo ser livre. Adequação e liberdade simultaneamente?
É uma senhora ambição. Demanda a energia de uma usina. Para que se consumir
tanto? A vida não é um questionário de Proust. Você não precisa ter que
responder ao mundo quais são suas qualidades, sua cor preferida, seu prato
favorito, que bicho seria. Que mania de se autoconhecer. Chega de se
autoconhecer. Você é o que é, um imperfeito bem-intencionado e que muda de
opinião sem a menor culpa. Ser feliz por nada talvez seja isso.