Assistindo ao ótimo "Closer - Perto demais", me veio à lembrança um poema chamado
"Salvação", de Nei Duclós, que tem um verso bonito que diz:
"Nenhuma pessoa é lugar de repouso". Volta e meia este verso me
persegue, e ele caiu como uma luva para a história que eu acompanhava dentro do
cinema, em que quatro pessoas relacionam-se entre si e nunca se dão por
satisfeitas, seguindo sempre em busca de algo que não sabem exatamente o que é.
Não há interação com outros personagens ou com as questões banais da vida. É
uma egotrip que não permite avanço, que não encontra uma saída - o que é
irônico, pois o maior medo dos quatro é justamente a paralisia, precisam estar
sempre em movimento. Eles certamente assinariam embaixo: nenhuma pessoa é lugar
de repouso.
Apesar dos diálogos divertidos, é um filme triste.
Seco. Uma mirada microscópica sobre o que o terceiro milênio tem a nos
oferecer: um amplo leque de opções sexuais e descompromisso total com a eternidade
- nada foi feito pra durar. Quem não estiver feliz, é só fazer a mala e bater a
porta. Relações mais honestas, mais práticas e mais excitantes. Deveria parecer
o paraíso, mas o fato é que saímos do cinema com um gosto amargo na boca.
Com o tempo, nos tornamos pessoas maduras,
aprendemos a lidar com as nossas perdas e já não temos tantas ilusões. Sabemos
que não iremos encontrar uma pessoa que, sozinha, conseguirá corresponder 100%
a todas as nossas expectativas ¿ sexuais, afetivas e intelectuais. Os que não
se conformam com isso adotam o rodízio e aproveitam a vida. Que bom, que
maravilha, então deveriam sofrer menos, não? O problema é que ninguém é tão
maduro a ponto de abrir mão do que lhe restou de inocência. Ainda dói trocar o
romantismo pelo ceticismo, ainda guardamos resquícios dos contos de fada. Mesmo
a vida lá fora flertando descaradamente conosco, nos seduzindo com propostas
tipo "leve dois, pague um", também nos parece tentadora a ideia de
contrariar o verso de Duclós e
encontrar alguém que acalme nossa histeria e nos faça interromper as buscas.
Não há nada de errado em curtir a mansidão de um
relacionamento que já não é apaixonante, mas que oferece em troca a benção da
intimidade e do silêncio compartilhado, sem ninguém mais precisar se preocupar
em mentir ou dizer a verdade. Quando se está há muitos anos com a mesma pessoa,
há grande chance de ela conhecer bem você, já não é preciso ficar explicando a
todo instante suas contradições, seus motivos, seus desejos. Economiza-se muito
em palavras, os gestos falam por si. Quer coisa melhor do que poder ficar
quieto ao lado de alguém, sem que nenhum dos dois se atrapalhe com isso?
Longas relações conseguem atravessar a fronteira do
estranhamento, um vira pátria do outro. Amizade com sexo também é um jeito
legítimo de se relacionar, mesmo não sendo bem encarado pelos caçadores de
emoções. Não é pela ansiedade que se mede a grandeza de um sentimento. Sentar,
ambos, de frente pra lua, havendo lua, ou de frente pra chuva, havendo chuva, e
juntos fazerem um brinde com as taças, contenham elas vinho ou café, a isso
chama-se trégua. Uma relação calma entre duas pessoas que, sem se preocuparem
em ser modernos ou eternos, fizeram um do outro seu lugar de repouso. Preguiça
de voltar à ativa? Muitas vezes, é. Mas também, vá saber, pode ser amor.
4 comentários:
O amor não deve cochilar, deve ficar atento com a pessoa amada. O verso diz isso, é exatamente sobre o amor. Não contradiz o amor, antes o celebra. O amor exige atenção permanente. O texto, que tem mais de dez anos, não faz justiça ao verso, que tem mais de 40 anos. O verso e sua pregação do amor é anterior ao texto que o contraria sem razão.
oi minha amiga,
ainda acredito que sempre pode ser amor,
sempre...
beijinhos
Hoje em dia está tão difícil se relacionar, por isso que as relações duram tão pouco.
bjokas =)
E lembrar que é através dos relacionamentos que a gente evolui...sempre! bjs
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