Mais
uma vez, não ignore a impermanência. O que quer que pareça ser prioritário em
sua vida é, na realidade, bastante temporário. Vem e vai. Nada é confiável.
Nascemos
sós e nus. Conforme a nossa vida se desenrola, passamos por todas as situações
possíveis: necessitar, possuir, perder, sofrer, chorar, tentar… mas depois
morremos, e morremos sós. Não fará a menor diferença se fomos ricos ou pobres,
conhecidos ou desconhecidos. A morte é o grande nivelador. Em um cemitério,
todos os corpos são semelhantes.
O
nosso relacionamento com os outros é como o encontro casual de dois estranhos
em um estacionamento. Olham um para o outro, sorriem e isso é tudo o que
acontece entre eles. Vão embora e nunca mais se veem. Assim é a vida – apenas
um momento, um encontro, uma passagem, e depois acaba.
Se
você compreender isso, não há tempo para brigas. Não há tempo para discussões.
Não há tempo para mágoas mútuas. Quer pense nisso em termos de humanidade,
nações, comunidades ou indivíduos, não sobra tempo para mais nada a não ser
apreciar verdadeiramente a breve interação que temos uns com os outros.
Nossas
prioridades mundanas podem ser irônicas. Colocamos em primeiro lugar aquilo que
julgamos ser o que mais desejamos; depois descobrimos que o nosso desejar é
insaciável. Pagar a casa, escrever um livro, fazer o negócio ser bem-sucedido,
preparar a aposentadoria, fazer longas viagens – coisas que estão
temporariamente no topo de nossa lista de prioridades, consomem nosso tempo e
energia completamente e, então, no fim da vida, olhamos para trás e nos
perguntamos o que todas essas coisas significavam.
É
como alguém que viaja em um país estrangeiro e paga a sua viagem na moeda
daquele país. Quando chega à fronteira, surpreende-se ao tomar conhecimento que
a moeda do país não pode ser trocada ou levada. Da mesma forma, nossas posses e
aquisições mundanas não podem ser levadas através do portal da morte. Se
confiarmos nelas, nos sentiremos, repentinamente, empobrecidos e roubados. A
única moeda que tem qualquer valor quando viajamos pelo limiar da morte é a
nossa realização espiritual.
Em um
sentido mundano, é melhor nos sentirmos satisfeitos e apreciarmos aquilo que já
temos. O tempo é muito precioso. Não espere até estar morrendo para compreender
a sua natureza espiritual. Se fizer isso agora, vai descobrir recursos de
bondade e compaixão que não sabia possuir. É a partir dessa mente de compaixão
e sabedoria intrínseca que você pode beneficiar os outros.
O
progresso espiritual começa quando resolvemos... seja cuidadoso. Se você
colocar-se no lugar do outro, vai perceber o quanto é destrutivo ferir ou matar
qualquer ser, ainda que seja um inseto. Todos os seres querem viver. Se você
cuidar dos outros com essa perspectiva, fechará as portas para o seu próprio
sofrimento.
A
mente é com um microscópio. Amplia tudo. Se você critica-se o tempo todo – “sou
tão pobre, não sou suficientemente alto, meu nariz é grande demais” – se
concentra a atenção em todas as suas inadequações e misérias, elas só piorarão
até que, em desespero, você fique prestes a desistir de tudo.
Em
vez de dizer: “sinto-me detestável. O que devo fazer?”, pense no sofrimento dos
outros e gere compaixão. É muito importante, realmente, ver o sofrimento,
prestar atenção no caixa do banco que está atormentando, no velho pálido e
cansado que arrasta os pés pela rua, na criança que chora infeliz. Veja a
profundidade do sofrimento e a partir daí dimensione o seu próprio sofrimento.
Os outros estão doentes, estão imersos na guerra e na fome, estão morrendo.
Compaixão
é o desejo fervoroso de que todos os seres, sem exceção, encontrem a liberação
do sofrimento, desde o seu pior inimigo até o seu melhor amigo. Para
desenvolver uma compaixão genuína que inclua todos, primeiro exercita a
compaixão com aqueles que lhe são próximos; depois estenda-a aos desconhecidos
e por fim a todos os seres por todo o espaço.
Depois
direcione o seu desejo para a felicidade deles. Como a felicidade vem apenas da
virtude, deseje que qualquer felicidade que os outros possam ter alcançado, em
função de suas virtudes passadas, possa nunca diminuir ou ser perdida, e que possa
aumentar sempre, até que alcancem a felicidade infinita e imutável. Esse desejo
pela felicidade dos outros é o significado verdadeiro de amor. Regozijar-se com
qualquer extensão de felicidade que os outros possam ter, traz uma alegria
ilimitada à nossa própria existência.
Reconheça
sempre a qualidade onírica da vida e reduza o apego e a aversão. Pratique o bom
coração em relação a todos os seres. Seja amoroso e compassivo, não importa o
que os outros façam. O que fazem não importará muito quando visto por você como
um sonho. Esse é o ponto essencial. Essa é a verdadeira espiritualidade.
Se
você usar manto, raspar a cabeça, rezar de joelhos todos os dias, e ainda assim
se tornar mais raivoso, orgulhoso, rígido e difícil de lidar, não estará
praticando a espiritualidade. Você precisa praticar a essência, que é a
compaixão e o amor altruísta, e a partir daí tentar ajudar os outros da melhor
maneira que puder. Use todos os seus cursos de corpo, fala e mente. Esse é o
método. Seja você cristão, hindu, judeu ou budista, a compaixão e o amor são os
mesmos. A vitória sobre as falhas e desilusões leva à vitória sobre a
morte. Meu desejo para cada um de vocês é que alcancem as qualidades de
compaixão e sabedoria e o supremo e imortal estado de iluminação.
Texto do livro “Vida e morte no
budismo tibetano”.
2 comentários:
Na verdade estamos aqui de passagem.
A morte é a única certeza da vida!
Temos que viver cada dia,como se fosse o ultimo.
Porque não sabemos se o sol nascerá amanhã.
Beijos.
Interessante, vivi para meus filhos,
quando adoeci, todos me ignoraram.
Para ter uma razão para aqui ficar,
busquei o próximo para ajudar,
foi aí que me encontrei.
Há pouco tempo,
esses mesmos filhos, pela ganância,
me desprezaram e me impossibilitaram
de ao próximo ajudar, para me levantar.
Embora só, não sei como estou em pé,
sustentada pela minha fé.
Blogs como o seu, Maria José, são muito
importantes, pois as mensagens e textos
que você publica, nos ajudam a refletir
e repensar valores que, erroneamente,
conservamos.
Obrigada, abraços carinhosos
Maria Teresa
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