Havia uma flor à beira de um rio que se apaixonou
pelo mar. Talvez por ouvir o sussurro das águas do rio, que corriam ansiosas
para desembocarem na sua imensidão, passou a amar profundamente aquele ser
conhecido apenas pelo ouvir falar do vento e dos pássaros. Apaixonou-se por
alguém que nunca viu, mas nunca viu; de longe ouvia o canto ritmado das ondas e
se imaginava naqueles braços, numa dança contínua da qual só os que têm em si
muito amor sabem o ir e vir. Sonhava com o dia em que pudesse estar envolvida
por aquele tão admirado e imenso ser. E sentiria suas pétalas acarinhadas por
alguém que, certamente, lhe saberia a alma de flor delicada.
Tanto sonhou e pediu, que um pássaro,
sensibilizado, mesmo avisando-lhe do risco que corria, atendeu seu pedido de cortar-lhe
a haste. Seguindo o rio e deixando-se levar pela correnteza, iria ao encontro
de seu querido e a ele juntar-se-ia para sempre.
Caindo no rio, sentiu de imediato seu corpo gelar
naquelas águas rudes e fortes que a arrastavam rapidamente. A princípio, gostou
daquela velocidade com que ia ao seu destino. Depois sentiu a primeira mordida
de um peixe que lhe amputou parte de uma pétala; começou, então, seu caminho de
sofrimento. Troncos no meio do caminho insistiam em lhe obstruir a passagem e,
cega, sendo levada pela força da água, batia contra pedras que iam lhe
dilacerando e tirando sua beleza de flor. Enormes cachoeiras traziam quedas
violentas. Medo vencido por uma determinação de quem sabe o que quer. Mesmo
quase desmaiada e toda machucada, levava consigo o alento de ir encontrar com
seu amor. Todas as dores do mundo não se comparavam à felicidade de realizar o
seu sonho. Tudo vale a pena quando se ama.
Até que, muitos dias depois, totalmente deformada e
quase inconsciente, viu chegado o momento com o qual sonhou. As águas do rio
encontravam-se com o mar com tanto ímpeto que, no encontro, foi arremessada
para cima. Naquele exato instante, olhou para o céu e agradeceu a Deus por
haver chegado a quem tanto amou. E seus pedaços boiaram inertes sobre aquelas
águas que, minutos depois, sequer lembrariam daquela pequenina criatura - um
dia tão linda - Flor.
Poucos, além dos pássaros e do vento, souberam da
flor, mas ela realizou seu sonho. Conheceu o mar!
Na vida, não podemos reclamar dos caminhos que escolhemos.
Qualquer caminho é uma opção nossa. Até morrer de amor.
Pensando nisso, entre duas lágrimas com gosto de
sal e o esboço de um sorriso irônico, de repente, me dei conta de uma coisa:
- Eu conheci o mar!
4 comentários:
Olá! Às vezes precisamos nos arriscar mais, ousar mais a que possamos ver o mar! abraços
Reclamamos muito da vida, às vezes por pequeninos problemas. Quando u depois vem um dia chega uma daquelas " tempestades terriveis " é que a gente pára e diz: afinal era feliz e não sabia. Penso que já todos de nós dissemos isso um dia, mas, não aprendemos, continuamos a reclamar e a interrogar a vida; mas ela não responde e continua o seu ciclo; só a nós compete saber a resposta e escolher o nosso caminho, mudando a direcção cada vez que acharmos necessário. O sofrimento e a felicidade caminham juntos e nós com eles. Um beijinho, amiga e...belo texto. Fica bem!
Emília
Desculpa amiga...quando depois chega uma daquelas --penso que já todos nós...
Beijos.
Emília
Oi Maria, estou encantada aqui. Vim através do blog da amiga Guaraciaba Pérides. Li textos excelentes.
O amor muitas vezes é assim, e nos contenta,mesmo assim, sem nos fazer sentir o peso de tanta dedicação, doação. Tudo por amor.
Lindo texto.
Te seguindo.
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