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segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

DESPEDIDA


E no meio dessa confusão alguém partiu sem se despedir; foi triste. Se houvesse uma despedida talvez fosse mais triste, talvez tenha sido melhor assim, uma separação como às vezes acontece em um baile de carnaval — uma pessoa se perde da outra, procura-a por um instante e depois adere a qualquer cordão. É melhor para os amantes pensar que a última vez que se encontraram se amaram muito — depois apenas aconteceu que não se encontraram mais. Eles não se despediram, a vida é que os despediu, cada um para seu lado — sem glória nem humilhação.
Creio que será permitido guardar uma leve tristeza, e também uma lembrança boa; que não será proibido confessar que às vezes se tem saudades; nem será odioso dizer que a separação ao mesmo tempo nos traz um inexplicável sentimento de alívio, e de sossego; e um indefinível remorso; e um recôndito despeito.
E que houve momentos perfeitos que passaram, mas não se perderam, porque ficaram em nossa vida; que a lembrança deles nos faz sentir maior a nossa solidão; mas que essa solidão ficou menos infeliz: que importa que uma estrela já esteja morta se ela ainda brilha no fundo de nossa noite e de nosso confuso sonho?
Talvez não mereçamos imaginar que haverá outros verões; se eles vierem, nós os receberemos obedientes como as cigarras e as paineiras — com flores e cantos. O inverno — te lembras — nos maltratou; não havia flores, não havia mar, e fomos sacudidos de um lado para outro como dois bonecos na mão de um titeriteiro inábil.
Ah, talvez valesse a pena dizer que houve um telefonema que não pôde haver; entretanto, é possível que não adiantasse nada. Para que explicações? Esqueçamos as pequenas coisas mortificantes; o silêncio torna tudo menos penoso; lembremos apenas as coisas douradas e digamos apenas a pequena palavra: adeus.
A pequena palavra que se alonga como um canto de cigarra perdido numa tarde de domingo.

Extraído do livro "A Traição das Elegantes

7 comentários:

Anônimo disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Anônimo disse...

Que texto maravilhoso!
É uma boa escolha perfeita,adorei!
Bjs

Roselia Bezerra disse...

Olá, queria Maria José
Feliz 2014!!!
Bjm fraterno

Lassalete Cunha disse...

Lindo texto! Penso que esta é a despedida menos imperfeita para a separação de dois amantes.
Beijinhos

Rô... disse...

oi minha amiga,

é tão lindo...
vou voltar e ler mais uma vez...

beijinhos

Unknown disse...

Maria Jose: Linda escolha deste texto adorei. esta despedida é a mais adequada para a despedida de dois amantes.
Beijos
Santa Cruz

Guaraciaba Perides disse...

Brilhou como uma estrela cadente e simplesmente se foi.Ficou uma lembrança boa e uma pergunta.
Belo texto!
um abraço